O papel do consultor sob a ótica de Peter Drucker

Introdução

Em ambientes empresariais cada vez mais exigentes, o papel do consultor não se restringe à entrega de relatórios, modelos ou recomendações pontuais. Para Peter Drucker, um dos maiores pensadores da administração moderna, a consultoria é, acima de tudo, uma atividade intelectual orientada para a geração de resultados concretos, sustentáveis e alinhados à finalidade essencial de qualquer organização.

Essa visão torna o papel do consultor muito mais profundo do que a prestação de um serviço técnico. Ela exige responsabilidade, rigor analítico, capacidade de diagnóstico e, sobretudo, um compromisso ético com a verdade.

No contexto dos Recursos para Inovação, incentivos fiscais, captação de recursos, gestão da inovação, essa abordagem mostra-se particularmente necessária. Drucker reconhece que o consultor é um agente externo chamado a ampliar a racionalidade do cliente, trazendo clareza ao que está confuso, transformando problemas difusos em decisões práticas e mitigando riscos decorrentes de más interpretações ou decisões intempestivas.

1. O consultor deve ser um observador imparcial

Um dos elementos centrais da visão de Drucker é a independência intelectual. O consultor não está na organização para confirmar crenças prévias nem para legitimar decisões já tomadas. Ele é contratado para enxergar aquilo que a empresa não vê, ou não consegue ver.

Essa imparcialidade é indispensável, por exemplo, na análise de elegibilidade de projetos no âmbito da Lei do Bem. A pressão interna por “fazer caber” determinados dispêndios pode induzir vieses e interpretações arriscadas. Cabe ao consultor atuar como contraponto técnico, apresentando o que é admissível e o que não é, ainda que isso contrarie expectativas internas.

Drucker reforça: a função do consultor não é agradar, mas ajudar. Esse princípio se alinha ao “primum non nocere” destacado no artigo O que torna um consultor excepcional. O primeiro dever de quem assessora é não causar dano, e poucas coisas prejudicam tanto uma empresa quanto diagnósticos mal formulados, enquadramentos artificiais ou promessas irreais.

2. Diagnosticar antes de recomendar

Drucker é categórico: não existe solução correta para um problema mal diagnosticado.

Ele equipara o trabalho do consultor ao do médico, paralelismo aprofundado no artigo já citado, e enfatiza que o maior erro de um consultor é oferecer soluções antes de compreender com precisão o problema real. Na visão “druckeriana”, quase sempre o problema que uma empresa enuncia não é o problema verdadeiro.

No campo da inovação e dos incentivos fiscais, isso é evidente. Empresas frequentemente afirmam que “não conseguem usar a Lei do Bem” quando, na verdade:

  • não possuem processos de registro técnico adequados;
  • não distinguem claramente PD&I de rotinas operacionais;
  • não estruturaram práticas mínimas de gestão da inovação;
  • ou simplesmente confundem dificuldades de gestão e estratégia com barreiras tecnológicas.

O consultor, segundo Drucker, deve estruturar a realidade antes de propor qualquer intervenção. Essa etapa, negligenciada por consultorias que operam no modelo “barato e rápido”, é a principal causa de insegurança técnica e rejeições posteriores, dilema já discutido em Consultoria em Lei do Bem: o dilema entre o ruim e barato e o bom e justo.

3. Fazer perguntas certas é a ferramenta mais poderosa

Para Drucker, o consultor eficaz não é o que oferece respostas prontas, mas o que formula as perguntas que a organização ainda não fez.

William A. Cohen mostra que Drucker, em suas consultorias, passava longas sessões apenas perguntando, com profundidade, precisão e insistência, até que a própria empresa começasse a enxergar novas possibilidades de solução.

No universo dos Recursos para Inovação, isso significa conduzir o cliente a compreender:

  • Quais são, de fato, os desafios tecnológicos enfrentados?
  • Existe hipótese científica formulada?
  • Quais metodologias foram utilizadas?
  • O que distingue esse projeto de uma melhoria operacional?
  • A empresa possui estrutura mínima para sustentar um processo contínuo de inovação?

Esse questionamento sistemático tem finalidade dupla: aprimorar o raciocínio da empresa e aumentar sua maturidade inovadora.

4. Competência técnica aliada a comportamento profissional

Embora Drucker reconheça o valor da expertise, ele reforça que competência técnica não é suficiente. É necessário integrá-la a comportamentos que sustentem a eficácia da consultoria: clareza ética, postura adequada, capacidade de comunicação e disciplina metodológica.

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O artigo O que torna um consultor excepcional explora exatamente esse ponto, mostrando que:

  • contrata-se pela técnica, mas demite-se pelo comportamento;
  • comunicação inadequada compromete diagnósticos;
  • rigidez metodológica sem sensibilidade prática destrói valor;
  • arrogância técnica obstrui a compreensão da realidade do cliente.

Para Drucker, o consultor deve ser confiável antes de ser brilhante.

5. O consultor como agente de transformação dos resultados

Drucker define consultoria como uma atividade orientada para melhorar o desempenho futuro do cliente, jamais para produzir relatórios que “descrevem a realidade”.

O consultor deve:

  • transformar análises em ações;
  • priorizar o que é essencial;
  • orientar decisões com impacto mensurável;
  • apoiar a implementação, quando necessário;
  • estabelecer métricas e acompanhar resultados.

No contexto da inovação, isso significa propor caminhos que ampliem a capacidade inovadora da empresa, como:

  • estruturação de processos mínimos de gestão da inovação (ISO 56002);
  • identificação correta de projetos de PD&I (Manual de Frascati, critérios de novidade e incerteza);
  • adequação de registros, documentação técnica e controles contábeis;
  • desenho de portfólio de financiamento (Lei do Bem, FINEP, BNDES, EMBRAPII etc.);
  • aumento da capacidade analítica de equipes internas.

Para Drucker, um consultor que não gera mudança efetiva limita-se a produzir análises estéreis.

6. A responsabilidade moral do consultor

Um dos pontos mais fortes da filosofia “druckeriana” é a noção de responsabilidade moral. O consultor deve agir de modo a proteger o cliente contra decisões equivocadas, inclusive aquelas que o próprio cliente deseja tomar.

Isso tem implicações diretas no mercado de incentivos fiscais: aceitar modelos de remuneração condicionada à “aprovação do MCTI”, prometer resultados ou assumir obrigações de fim (e não de meio) fere princípios fundamentais da boa prática consultiva, como já analisado no artigo sobre o dilema do mercado de Lei do Bem.

Para Drucker, consultoria não é submissão, mas serviço.
E servir implica dizer a verdade de forma clara, fundamentada e ética, mesmo quando isso contraria o interesse imediato do contratante.

Conclusão

A visão de Peter Drucker eleva a consultoria a um patamar superior ao da simples prestação de serviços especializados. Ela exige:

  • rigor intelectual;
  • clareza ética;
  • independência;
  • método;
  • capacidade de diagnóstico;
  • competência técnica;
  • e compromisso com a transformação real.

No campo dos Recursos para Inovação, essa visão mostra-se indispensável. Projetos de PD&I, captação de recursos e conformidade fiscal exigem mais do que conhecimento normativo: exigem discernimento, responsabilidade e capacidade de orientar decisões estratégicas.

A atuação consultiva, nessa perspectiva, não é um acessório, mas um fator determinante da segurança técnica, da eficiência fiscal e da maturidade inovadora das organizações.

Se sua empresa busca aprimorar seus processos de inovação e elevar a qualidade de suas decisões estratégicas, essa é a abordagem consultiva que efetivamente gera valor, e que Drucker, décadas atrás, já havia colocado como horizonte de excelência.

Edwin Lima é consultor em Recursos para Inovação (Incentivos Fiscais, Captação de Recursos e Gestão da Inovação) e atua há mais de 10 anos assessorando empresas a melhorarem seus resultados através de recursos para inovação, contemplando as áreas de incentivos fiscais para P&D (Lei do Bem, Tecnoparque Curitiba entre outros);captação de recursos para projetos (FINEP, BNDES, FAPESP entre outros) e implementação de sistema de gestão da inovação (ISO 56002).


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